A Consagração e a aprovação dos Estatutos

A Situação e a Oposição no Círculo Cultural Scalabitano – A Consagração e a aprovação dos Estatutos

Publicado no Correio do Ribatejo 30/12/2011

Entre 1955 e 1959, viveram-se no Círculo Cultural Scalabitano momentos de entusiasmo e grande afirmação cultural. Ora, a primeira direcção eleita a 29 de Dezembro, tomou posse no dia 3 de Janeiro de 1955(1), data da sua primeira reunião.

Visita do Ministro da Educação ao CCS, dia 15 de Março de 1957. Arquivo CCS

Visita do Ministro da Educação ao CCS, dia 15 de Março de 1957. Arquivo CCS

A Consagração

A consagração do Círculo Cultural iniciou-se com o anterior prestígio alcançado pelo Grémio Literário Guilherme de Azevedo, bem como pelo reconhecimento nacional do Orfeão Scalabitano, do qual herdou o grau de comendador da Ordem de Benemerência(2), atribuída em 1932.
No entanto, ganhou de imediato merecimento próprio quando, a enorme actividade organizada pelas diferentes secções, encontrou junto dos escalabitanos, das instituições oficiais e privadas e da administração local e central, o apoio e o patrocínio que lhes permitiu expandir o seu nome por todo o país, sendo as suas secções bastante vezes requisitadas para aureolar diversas festividades e comemorações.

E, apesar das entidades nacionais não terem tornado fácil a vida das associações por estas representarem uma herança democrática do liberalismo e do republicanismo português, o Círculo Cultural Scalabitano conseguiu convencer a administração local de que era um representante resplandecente e digno de uma cidade que se queria afirmar nacionalmente pujante e rica, tal como augurava o crescimento económico do ano de 1954. Assim, mereceu a primeira Medalha de Ouro atribuída na história do Município de Santarém, em sessão camarária de 3 de Outubro de 1956, sob proposta do vereador Caetano Marques dos Santos e, logo em Julho de 1957, conquista o diploma do grau Oficial da Ordem da Instrução Pública, após uma oportuna visita do Ministro da Educação, no dia 15 de Março, ocasião em que fora inaugurada a Escola Comercial e Industrial de Santarém [dia de aniversário da “Reconquista de Santarém aos Mouros”]. A propósito desta se anotou, em Acta n.º 33, de 14 de Março de 1957: “Foi lida e apreciada a representação a entregar ao senhor Ministro da Educação Nacional, expondo a situação do Círculo, a sua vida associativa, a sua obra cultural e artística, apontando os meios precisos para mais expansão dessa obra e solicitando-os como imprescindíveis”(3). Nesta ocasião, pediam-se apoios, mas os Estatutos ainda se encontravam no Ministério, para aprovação superior, sem que se vislumbrasse a sua aprovação.

Os Estatutos

O processo de aprovação superior dos Estatutos, não terá sido tão fácil quanto a atribuição de medalhas e, legalmente, a vivência desta novíssima associação só viria a ser definitivamente confirmada a 26 de Junho de 1958. Não terá sido falta da Direcção ou seu desleixo, pois os estatutos foram redigidos e aprovados em reunião de Assembleia Geral expressamente convocada para tal fim, no dia 6 de Dezembro de 1954. Após um ligeiro impasse sobre a tutela que os deveria aprovar, o Relatório da Gerência de 55 deu conta da sua entrega para aprovação, em Janeiro, no Ministério da Educação Nacional. Como se pode verificar, foi necessária uma grande espera, muita influência junto dos organismos estatais, para o que contribuíram as visitas do próprio Ministro da Educação e as diligências do Governo Civil e da Câmara Municipal, pois pelos vistos não chegara a influência do presidente do Círculo, Artur Proença Duarte, o ilustre representante do regime.

A conquista da aprovação dos Estatutos não se fez sem concessões: em conformidade com os princípios impostos pelo regime vigente, inscreveu-se no Artigo 2.º, dos seus novos Estatutos, “O Círculo Cultural é uma colectividade que tem por objectivo a difusão da cultura popular”(4), no Artº 7º, “É absolutamente defeso tratar de assuntos políticos e religiosos”(5) e,ainda, no Artº 18º, “…que os corpos directivos somente podiam entrar em funções, depois de sancionados superiormente”. Para que não houvesse dúvidas sobre a causa da inscrição deste último
parágrafo do artº 18º, à laia de justificação, a Direcção deixou registado na última folha umas “Anotações: A Inspecção Superior do Ensino Particular, em ofício de 11 de Fevereiro de 1958 – Livro B – Processo nº 147 – devolveu os estatutos para, de harmonia com a legislação em vigor introduzir no artº 18º, um parágrafo em que ficasse mencionado “que os corpos directivos somente podiam entrar em funções, depois de sancionados superiormente”.
Não fora o sucesso obtido durante este tempo, o Círculo Cultural não poderia exercer legalmente as funções para que fora criado.

Luísa Barbosa

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() Círculo Cultural Scalabitano, Livro de Actas da Direcção, 29 de Julho de 1954 a 12 Fevereiro de 1957, Acta nº 1, 1955. Arq. C.C.S.
(2) Condecoração atribuída pela “Presidência da República, Chancelaria das Ordens Portuguesas. Por decreto de 15 de Abril de 1932, nos termos do regulamento das Ordens Portuguesas, sob proposta do Presidente do Ministério… (Diário do Governo nº 93, II série, 21 de Abril de 1932)” in O Orfeão, número único, Santarém, Maio de 1932.
(3) Círculo Cultural Scalabitano, Livro de Actas da Direcção, 29 de Julho de 1954 a 12 Fevereiro de 1957, Arq. do C.C.S.
(4) “Cultura Popular” foi um conceito adoptado pelo Estado Novo, e promovida pelo SNI, sob a liderança de António Ferro, em 1944, e que se subentendia ser a “cultura nacional” e de uma “consciência histórica colectiva”, uniformizadas e consideradas a “verdade” única e indiscutível, aligeirada, portanto, pronta a consumir e fácil de interiorizar/apreender. Para aprofundamento deste conceito consulte-se: Daniel Melo, Salazarismo e Cultura Popular (1933-1958), Lisboa, Imprensa de Ciências Sociais, 2001.
(5) Para o Estado Novo as questões políticas e religiosas não tinham discussão porque estavam resolvidas.


A nova produção do Veto Teatro Oficina

“Não se Ganha Não se Paga”

Publicado no Correio do Ribatejo em 6/1/212.

Não se ganha, não se Paga é a próxima produção do Veto Teatro Oficina. Peça do dramaturgo italiano Dário Fo, Nobel da Literatura (1997), escrita inicialmente em 1974, com o título de não se paga, não se paga e reescrita pelo mesmo autor em 2008 com o título que agora ostenta: Não se Ganha, não se paga.

Caracterizada como uma comédia “de intervenção”, esta é uma comédia de humor corrosivo que retrata a crise que se sente atualmente, de uma forma irónica por vezes, caustica por outras, brincado de uma forma muito séria com a crítica situação económica da nossa sociedade actual.

Cartaz

Antónia, uma das personagens participa num assalto a um supermercado e arrasta consigo a amiga margarida. O marido preso a sólidos princípios morais nem quer ouvir falar de roubar mercadorias, senão, ameaça “mato-te e, depois peço o divórcio”.

Um polícia filosofa sobre a essência da vida e o cinismo da nossa sociedade, a corrupção dos políticos, enquanto passa uma busca às casas do bairro e o guarda-republicano todo militarista, bem deste é melhor nem falar.

Um camião voltado na estrada e carregado de soda cáustica (transportava afinal mercearias contrafeitas: arroz, massa, açúcar), é o ponto de viragem e o tal marido dos fortes princípios morais repensa a sua posição na vida.

O teatro de intervenção político-laboral, Jogo de enganos, Reacção à crise do capitalismo? Tudo isso e muito mais. Mas, segundo Rui Monteiro em artigo na Time Out (9 de Fevereiro de 2010), também retorno feliz a um teatro dedicado, mesmo que por vezes um pouco enviesadamente, às coisas reais com que homens e mulheres concretos lidam. E disposto a apontar um caminho, por vezes duvidoso, contudo geralmente sincero, para além do conformismo ou da indiferença – o que faz pensar na ausência de uma dramaturgia portuguesa interessada nos movimentos sociais, no desinteresse dos autores pelas coisas realmente terrenas, ou se calhar na pura e simples inexistência de dramaturgos de tipo não-contemplativo, se calhar por dependerem um bocadinho demais do humor do Estado.

Alegoria à crise e às dificuldades com que a classe média e média baixa se deparam, Não se Ganha, Não se Paga, procura refletir sobre este difícil momento das nossas vidas, momento que o próprio Belmiro de Azevedo, conhecido como patrão da SONAE, em recente entrevista a um órgão de Com. Social, concluía da mesma forma: Não se ganha, não se paga.

Com estreia prevista para Fevereiro, no Teatro Taborda, (Círculo Cultural Scalabitano) em tom ligeiro, o espetáculo apresenta situações de grande comicidade e boa disposição, pois a crise é tão grande que só pode mesmo ser levada a rir.

Nuno Domingos


A fundação e composição social

Correio do Ribatejo, 9 de Dezembro de 2011

A Situação e a Oposição no Círculo Cultural Scalabitano – A fundação e composição social

Primeira Direcção do CCS eleita em 27/12/1954

O ano de 1954 apresentou-se auspicioso para a cidade de Santarém e para o concelho, tendo ficado marcado pela construção de importantes obras públicas como a inauguração do Tribunal de Santarém, o início dos arranjos do Campo Sá da Bandeira e, conta-se ainda, como uma importante expressão do crescimento económico do distrito a criação da Feira do Ribatejo e a constituição do Círculo Cultural que resultou da fusão do Orfeão escalabitano e do Clube Literário Guilherme de Azevedo

A Fundação do CCS

Ora desta fusão resultou a formação de uma Comissão Administrativa(1) , cuja composição estava estabelecida no documento Bases para a Fusão do Clube Literário Guilherme de Azevedo e Orfeão Scalabitano elaborado pelas direcções das duas associações: “Esta Comissão será constituída por dezoito membros, nove de cada uma das colectividades fusionadas…”(2) . Continuaram a sua actividade cultural as secções que já constituíam anteriormente as duas agremiações: o Orfeão Scalabitano, a Orquestra Típica Ribatejana, o Curso de Iniciação Teatral “Actor Taborda”, o Coral Infantil Scalabitano e, ainda, a Biblioteca “Guilherme de Azevedo”. O nome de Círculo Cultural Scalabitano surgiu pela primeira vez num artigo do Correio do Ribatejo, na sua edição de 7 de Agosto de 1954.
Para que se possa conhecer os pioneiros desta acção, passamos a nomear os elementos dos seus corpos directivos: presidente – Artur Proença Duarte; 1º vice-presidente – Manuel d´Almeida Ginestal Machado; 2º vice-presidente – João da Silva Martins; 1º secretário – Américo Rodrigues de Passos e Silva; 2º secretário – Francisco Duarte Meireles; secretários adjuntos – Manuel Filipe; Gabriel Alves Alexandre; tesoureiro – Carlos Roque de Oliveira e Sousa; tesoureiro Adjunto – Manuel Marecos Henriques; vogais para o assunto dos estatutos – Alfredo Ferreira; Vasco Duarte; Leonardo Ribeiro de Almeida; José Carlos de Oliveira Sollas; vogais para os assuntos de instalação – Henrique Dias Ferreira; Artur Sousa Madeira Cabral; Nuno António de Oliveira; Gentil Duarte; vogal para a Orquestra Típica – Mário Martins Rodrigues; bibliotecário – Vasco Duarte.

O Relatório de 1954

No final do seu mandato, esta Comissão elaborou um Relatório onde referiu as diversas actividades concretizadas: o curso de teatro, com 30 alunos, dirigido pelo professor Carlos de Sousa, participou no “Sarau Garrettiano” organizado por ocasião das comemorações nacionais do centenário de Garret; o Orfeão Scalabitano, dirigido pelo professor Fernando Cabral concretizou três concertos radiofónicos, na Emissora Nacional; o Coral Infantil, dirigido então por Joel Canhão, depois da doença do maestro Luís Silveira que o veio a vitimar em 25 de Dezembro de 1954, contava com cento e vinte alunos, setenta dos quais no primeiro ano; a Orquestra Típica, então designada de Ribatejana, conduzida pelo maestro Casimiro Silva apresentou-se em dois concertos, a convite do SNI e o outro da TAP; a Biblioteca estava a ser catalogada.
Relativamente à “situação económica e financeira”, conforme seria de esperar, escreveu-se: “Pelos mapas juntos se vê, claramente, que é boa a situação económica e financeira da colectividade e que ela pode continuar a sua missão sem quebra de ritmo e sem perigo”.(3)

A caracterização socioprofissional

A primeira direcção eleita a 29 de Dezembro de 1954, tomou posse em 5 de Janeiro de 1955 e iniciou desde logo as suas funções.
Com 943 sócios, em 1955, o Quadro Demonstrativo das Profissões, Situações Económicas, etc. dos Associados (5) possibilitou a caracterização socioprofissional desta associação, verificando-se a existência de um grande número de funcionários da administração pública (154), de bastantes empregados no comércio e de escritório (164), de um número considerável de “Industriais” (101) e “Comerciantes” (165), de “Proprietários” (50), profissões liberais (médicos, médicos veterinários, advogados, engenheiros civis, agrónomos e silvicultores – 86), oficiais e sargentos do exército (44), domésticas (30) e ainda, as empresas (44). Os grupos sociais pouco representados são, como seria de esperar, os agricultores (3), “criados hoteleiros, de cafés, clubes, etc.” (7), padres católicos (1), operários e artífices (0) .(6)
Comungando com a expressão de Fernando Rosas(7) , predominavam no Círculo Cultural Scalabitano “a camada superior” do “vasto pântano das classes intermédias” urbanas, onde se excluíam, de vez, “as camadas inferiores” dos operários, artífices e serviçais. Os mais liberais, quando queriam levar as serviçais consigo aos bailes, tinham de as fazer passar por familiares .
O Círculo Cultural conheceu o seu período dourado neste lustro (1954-59) porque, na fusão das duas associações, prevaleceu o esforço da elite local, nomeadamente a elite política quer da Situação quer da Oposição.

Luísa Teixeira Barbosa
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(1) Círculo Cultural Scalabitano, Livro de Actas da Direcção, n.º 1, Acta de posse da Comissão Administrativa, 29 de Julho de 1954. Arq. C.C.S.
(2) Número II, § 2.º. Bases para a Fusão do Clube Literário Guilherme de Azevedo e Orfeão Scalabitano, [Julho de 1954], Arq. C.C.S..
(3) Círculo Cultural Scalabitano, Relatório da Comissão Administrativa, 1954. Arquivo do CCS.
(4) Círculo Cultural Scalabitano, Op. Cit, 27 de Dezembro de 1954.
(5) Círculo Cultural Scalabitano, 1955.
(6) Círculo Cultural Scalabitano, Relatório e Contas da Direcção Referentes à Gerência de 1955, 31 de Dezembro de 1955.
(7) “Os grupos sociais intermédios (…) não se limitavam, (…) às classes médias, isto é, à sua muito minoritária camada superior, constituída pelos pequenos e médios patrões da agricultura, da indústria e do comércio, associados aos estratos médios das profissões liberais, dos quadros ou do funcionalismo. O grosso das situações intermédias era constituído (…), pelos “camponeses médios”, pelo artesanato industrial e proto-industrial, o pequeno e pequeníssimo comércio lojista, e os “camponeses pobres”, os operários-camponeses ou artesãos, os trabalhadores familiares, os serviçais (…) a que se poderiam juntar os sectores mais pobres da pequena burguesia urbana (camadas inferiores dos empregados, do funcionalismo, etc.) (…) e constituíam a maioria sociológica da população”. Fernando Rosas “O Estado Novo” in José Mattoso (dir.) História de Portugal, vol. VII, Lisboa, Estampa, 1998.
(8) Testemunho de Lucinda Selqueira.


Sarau comemora 57 anos cheios de vida

O Círculo Cultural Scalabitano comemorou no passado sábado dia 3 de Dezembro, o seu 57º aniversário, com uma gala que decorreu no renovado Teatro Taborda.
Actuaram as secções e academias, numa demonstração da vitalidade e da diversidade de oferta cultural que atualmente oferecem a Santarém.
Em breve intervenção de abertura, o presidente da associação, reconheceu o momento difícil que todo o movimento associativo atravessa, devido à crise e à ausência de pagamento de compromissos assumidos por algumas entidades, mas reforçou a importância da actividade desenvolvida para a oferta cultural de Santarém e agradeceu a todos os voluntários, professores e mestres que têm tornado possível ao Círculo manter a sua atividade, desde sempre pautada por elevados padrões de qualidade, envolvendo semanalmente mais de um milhar de ativistas.
Quanto ao espectáculo propriamente dito, entendido mais como uma festa, dedicou parte substantiva da sua programação à apresentação de aspectos menos conhecidos da atividade cultural do Círculo Cultural Scalabitano.
A abertura esteve a cabo da Oficina da Música com duas guitarradas pelo jovem João Pedro Limeiros de apenas 7 anos, bandolim da Orquestra Típica Scalabitana que Interpretou “Canto Amor” de Carlos Paredes e “Fado Corrido” de Alfredo Marceneiro. Seguiu-se-lhe a também jovem Rita Figueiredo, soprano da Orquestra Típica Scalabitana, que interpretou “What a Wonderful World” (versão imortalizada por Louis Armstrong), “Senhora do Mar” e “Chuva” (música popularizada por Marisa).
Seguiu-se a intervenção do Jardim do Tango que nasceu há 2 anos no Círculo Cultural Scalabitano, onde dá as suas aulas regulares aos domingos. São a mais recente oficina desta associação, mas têm participado em vários espectáculos e festivais internacionais, como o Festival de Sitges (Barcelona, Espanha), onde a sua paixão e dedicação fez deles a figura do cartaz da sua próxima edição. Vasco Serranho e Carla Cruz dançaram “Por una Cabeza”, um original de Carlos Gardel, num primeiro momento e mais tarde “De Mis Tiempos”, uma milonga, o ritmo mais “crioulo” do tango argentino.
O Grupo An!mal nasceu em 2007 formado por alunos da Escola Alexandre Herculano que, após terminar os estudos naquela escola, quiseram continuar o seu clube de teatro. O seu professor Rui Lopes veio ter ao Círculo e ao Veto e a sintonia foi perfeita. Desde essa altura no seio do Círculo, entre nós, têm participado todos os anos no projecto PANOS, uma organização da CulturGest, tendo apresentado um dos seus trabalhos: “O Gajo”, texto ícone do grupo.
Vertente eventualmente menos conhecida do trabalho que se desenvolve no Círculo, a Academia de Esgrima Histórica e Artística, estruturada em três componentes: Formação Desportiva, Formação Histórica e Artística e Grupo de Recreação Histórica “Scalabitanus” que está no CCS desde 2001. No sarau, apresentaram algumas técnicas de combate Medieval e Renascentista, num momento que talvez pela surpresa criada, suscitou o interesse de inúmeras pessoas em inscrever-se para aprender esta nobre arte das escolas portuguesas e europeias.
A professora Encarnação Noronha e as suas alunas da Academia de Dança e Expressão Corporal trouxeram ao sarau o Ballet com uma coreografia criada a partir do tema “LOVE” (imortalizada por Nat King Cole). No palco do Teatro Taborda, estiveram alunas de dois níveis de aprendizagem do Ballet: Avançado e Grau 7.
O Veto Teatro Oficina apresentou um excerto do espectáculo “Beatriz Costa, uma Mulher Admirável”, também ele um excerto do filme “Aldeia da Roupa Branca”.
Neste pedaço, não apareceu a grande atriz, mas com o Veto, fomos à aldeia ver como vão os carregos de roupa para Lisboa e a festa, num quadro da mais viva comicidade.
O Sarau terminou com um convite a todos os presentes para dançar um tango, pelo que o palco se encheu de alegria e risadas, numa demonstração de que a cultura está viva e o Círculo é de facto uma associação de referência da cidade.

Nuno Domingos


A Situação e a Oposição no Círculo Cultural Scalabitano

Publicado no Correio do Ribatejo no dia 25 de Novembro de 2011

(1954-1974)
Arranjos do Campo Sá da Bandeira, iniciados em 1954. Fonte Arquivo de Zeferino A. Silva
O Círculo Cultural festeja agora o seu 57º aniversário e, durante os 20 anos a que se referem os próximos artigos relativos à história da sua acção.
Esta associação deteve uma enorme presença e influência no panorama social e cultural da Cidade e também do país, à época sob o governo ditatorial e totalitário de Salazar. Este sucesso, num regime político que perseguia e dificultava a vida associativa de tradições democráticas, deveu-se essencialmente a um compromisso entre aqueles que na direcção, ou nas suas secções, representavam a Situação e aqueles que se manifestavam como Oposição ao regime que então se vivia. As associações, apelidadas neste período de colectividades, eram uma ameaça ao carácter Uno e Totalitário, estabelecido pela ditadura pois, o associativismo era herdeiro de um ideário liberal, republicano e democrático, ou seja, de ideias que defendem o desenvolvimento do país através da pluralidade e diversidade de ideias. Quais eram, então, as características da organização associativa? E qual a sua composição social CCS? Quem eram os representantes destas duas facções políticas? Que actividades se ligaram à acção da oposição, que actividades denunciaram o controlo do Estado Novo e quais as que reflectiam os conceitos culturais do Estado Novo?

O dinamismo social no pós – Grande Guerra

O Portugal, das décadas de 50 a 70, caracterizou-se por um processo de industrialização e terciarização da economia portuguesa, com a consequente urbanização, ou seja, a saída de pessoas ligadas ao campo com destino à cidade. A indústria cresceu a partir da década de 40 com a influência de uma corrente industrialista que exercia pressão sobre o governo de Salazar. Enquanto outros, aqueles cujos interesses estavam ligados ao ruralismo tradicional, tentaram impedir as reformas e a modernização. No entanto, o peso socioeconómico da agricultura diminuiu nestas décadas.
A década de 50, aquela em que o Círculo Cultural Scalabitano foi fundado, distinguiu-se, então, por um crescimento económico, reflectido no I Plano de Fomento de 1950, a partir do qual se iniciou o plano de hidráulica agrícola, povoamento florestal e colonização interna.
Apesar de tudo, o sector agrícola foi promovendo a sua lenta modernização: os grandes agrários do Ribatejo, aproveitaram uma linha de crédito e compraram máquinas agrícolas (Lei n.º 2017, de 1946), introduziram novos produtos mais rentáveis, como o arroz e o tomate, e aproveitaram a instalação das indústrias agro-alimentares que, além de absorver parte da mão-de-obra assim disponível, vieram complementar o papel dos novos investimentos agrícolas. Em consequência, no período entre 1950 e 1973, registou-se uma certa modernização e crescimento dos sectores de actividade da região .

O crescimento de Santarém

Esse crescimento, reflectiu-se na Cidade no ano de 1954 que “… manda a verdade que se diga, foi bom e próspero para a Cidade e para o Concelho”, referia-se assim o título de primeira página do Correio do Ribatejo , sobre a gerência do Município, cujo presidente da Câmara era, então, Jacob Pinto Correia. Durante este ano, o da fundação do Círculo Cultural Scalabitano, verificaram-se, entre outros melhoramentos, o início dos arranjos do Campo Sá da Bandeira, a aquisição do palácio do Provedor das Lezírias, onde se viria a instalar a Câmara Municipal, bem como a proposta, concepção e criação da Feira do Ribatejo que se estreou no mês de Maio de 1954.
Como seria de esperar, o crescimento dos sectores de actividade do Distrito reflectiu-se no crescimento da cidade de Santarém e no investimento que esses sectores aplicaram nas actividades culturais. Este curto período, entre 1955 e 1960, revelou-se de grande dinâmica social e cultural e foi espelho dessa breve conjuntura económica favorável. Por isso, o primeiro lustro de existência do Círculo Cultural Scalabitano foi o mais brilhante do período a que reportamos o artigo.

A Fusão

As razões que levaram à fusão do Orfeão Scalabitano e do Clube Literário Guilherme de Azevedo estão certamente ligadas com a falta de sede do Orfeão Scalabitano e as dificuldades económicas por que passava o Clube Literário Guilherme de Azevedo. O primeiro, instalado no Ginásio do Seminário, coabitava com outras organizações católicas que utilizavam o espaço e os desentendimentos não se fizeram esperar quando, em 1953, o Concerto Radiofónico mensal de Dezembro, que este coro tinha acordado com a Emissora Nacional, coincidiu com uma “intempestiva” reunião de um desses organismos de caridade . Por outro lado, a análise aos livros de contabilidade do Clube Literário, revelaram os problemas de receitas e as dificuldades de pagamento das despesas correntes. Assim, apesar dos interesses diversos, as duas associações, cuja experiência convivial se tinha revelado difícil no passado (data em que o Orfeão abandona o Teatro Taborda e se instala no Ginásio de Seminário), resolveram unir esforços e estabelecer um conjunto de regras que possibilitou resolver o problema da sede do Orfeão e a prossecução da acção cultural das duas agremiações sob uma nova designação e estatutos.
A fusão das duas associações concretizou-se no dia 29 de Julho de 1954 com a tomada de posse de uma Comissão Administrativa que, além de prosseguir com as actividades próprias às associações em causa, concretizaram obras de beneficiação da sede “graças ao precioso auxílio do sr. dr. Firmino da Silva Pereira, actual proprietário do edifício…” , e procedeu à marcação da necessária Assembleia-geral de sócios, para 27 de Dezembro de 1954, dando fundamento legal ao Círculo Cultural Scalabitano.

Este artigo tem por base a conferência Portugal Uno, Portugal Plural, proferida no Círculo Cultural Scalabitano a 18 de Maio de 2006 e resulta do aprofundamento do trabalho de investigação realizado pela autora nos Arquivos do CCS, complementado no Arquivo Distrital, no Arquivo da PIDE/DGS- ANTT, nos jornais escalabitanos, folhetos e outros livros de memórias relacionados, desde que ingressou na Direcção do Círculo Cultural Scalabitano, em 2001.

Consulte-se: Fernando Rosas, “O Estado Novo (1926-1974)”, História de Portugal, dir. de José Mattoso, vol. 7, Lisboa, Editorial Estampa, 1996.
19-2-55.
Consulte-se: Correio do Ribatejo, Janeiro de 1954.
Correio do Ribatejo, 2-10-54.


ASSOCIATIVISMO II DO MODELO À ACÇÃO

Publicado no Correio do Ribatejo em 18/11/11

No último número iniciei neste espaço uma reflexão sobre as Associações Culturais e um modelo de acção para o seu funcionamento.

Terminei enunciando algumas preocupações directamente ligadas ao seu funcionamento e, mais importante, à postura que considero deve ser aquela que deverão privilegiar, tendo terminado o artigo anterior numa referência ao papel a desempenhar pelos voluntários na organização.

Hoje em dia esse papel é cada vez mais reconhecido e também cada vez mais procurado a diversos níveis e áreas da intervenção na comunidade. Assim acontece nas organizações de economia social, assim acontece no desporto, assim acontece cada vez mais nas instituições da “economia cultural”, se se me permite a expressão.

De resto, na essência do funcionamento da quase totalidade das instituições culturais não governamentais do nosso concelho, e muitas são, o que mais se vê são voluntários: nos grupos de teatro, nos grupos corais, em boa parte dos activistas das bandas filarmónicas, nos ranchos folclóricos, na gestão de associações e colectividades, etc. Por outro lado, se observarmos com atenção, até na maioria dos investimentos em arte pública (estátuas, bustos, etc.) ou na construção de equipamentos (como os teatros por exemplo), é destacada a participação dos chamados elementos da sociedade civil, com maior ou menor participação de mecenas, com alguma ou nenhuma participação do estado.

Importa pois reconhecer o papel desses agentes e procurar ampliar a sua base social de recolha, estimulando a sua participação, encontrando espaços para a sua participação, descobrindo maneiras de aproveitar o que cada um tem para oferecer, disponibilizando espaços e tempos de reconhecimento e prazer no acto de dar e participar.

A este respeito e conquanto se viva um tempo de egoísmos e singularidades, de formas de comunicação cada vez mais pessoais e solitárias, a oportunidade, até pelo contexto de crise, de poder encontrar com outros e redescobrir prazeres que começam a estar arredados da nossa esfera corrente de comunicação alargada, pode constituir alternativa relevante e relevantemente atractiva. Assim a consigamos apresentar de forma atractiva e interessante, desafiadora e carregada de simbolismo.

A ampliação de um tal movimento participativo, só poderá ter reflexos convenientes junto de possíveis mecenas, propiciando o reconhecimento claro do papel desempenhado pela nossa instituição e da sua importância, elemento facilitador do interesse e do possível apoio.

Um último aspecto para o qual pretendo chamar a atenção, é para o factor de que mais se tem falado nos tempos correntes e que designamos comummente como mercado. A este respeito, tendo em atenção que diferentes propostas permitem diferentes aproximações a diferentes potenciais mecenas, importa ressalvar que um planeamento a 5 anos pode permitir antecipação da negociação de apoios mecenáticos e por outro lado, criar tendências e hábitos junto do público, permitindo promover a venda antecipada e coerente de ingressos (política de bilhete válido por um ano, permitindo entrada em diferentes espectáculos), acolher diferentes participações desde a pequena doação de quem só pode contribuir com a quota mensal, a quem é capaz de apoiar de outra forma, criando respostas no seio da organização para todas estas participações.

Poderia se quisesse dar inúmeros exemplos de acções concretas dos agentes culturais de Santarém ou do resto do país relativos a cada uma das propostas que no conjunto destes dois artigos aqui referi. Naturalmente que aqui, como em tudo na vida, parti da realidade para o possível desenvolvimento do modelo. Importaria, no entanto, passar dessa constatação avulsa para uma acção integrada e estruturada, estrategicamente pensada, única forma que actualmente concebo de reinventar esta realidade quase intemporal que é constituída pelo mundo do associativismo cultural.

Esse é o verdadeiro desafio com que estamos confrontados e, na actual situação de crise em que vivemos, poderá representar papel de acrescido valor e relevância social.

Nuno Domingos


ASSOCIATIVISMO REFLEXÕES EM TORNO DE UM MODELO

Publicado no Correio do Ribatejo em 3/11/11

Segundo Michael Kraiser, reflectindo sobre as questões de cultura e de gestão cultural numa conferência em Setembro de 2010 no CCB, as Associações Culturais e os Agentes Artísticos, de um modo geral, têm um problema de receitas, não um problema de custos. O normal é conseguirem fazer muitas coisas com poucos recursos, reconhecendo que o que ainda não sabemos é como criar receitas e precisamos de fazê-lo de maneira consistente.

Importa pois reflectir sobre o que é que pode criar receitas e, aqui a resposta só pode ser: “boa actividade artística e cultural”, acrescentando: “suportada por um marketing forte e agressivo”. Cortar nos custos de programação e de marketing é uma estratégia que assegura que as futuras receitas venham a cair e portanto conduzindo a novos cortes na programação, ou na qualidade da mesma e como consequência disto, uma organização cultural torna-se demasiado pequena para ter importância e é por isso que a nossa actividade artística está em crise. Há pois que manter a actividade vital e trabalhar mais que nunca para passar a nossa mensagem. As organizações que competirem bem sobreviverão e recuperarão quando a economia recuperar, as que mantiveram a política de corte e redução, tornar-se-ão irrelevantes. Precisamos pois, mais do que nunca de formar “gestores culturais” que possam promover a sua oferta, conquistar mecenas, desenvolver relações que possam competir num espaço mais alargado. Precisamos que os mecenas, filantropos e fundações reconheçam o papel vital das organizações culturais para o desenvolvimento da sociedade como um todo.

Seguindo esta formulação, uma estratégia de afirmação do trabalho das instituições culturais terá sempre que passar pela afirmação constante de um “trabalho de grande qualidade artística”, prestigiada, excitante e atenta à realidade envolvente, marca de sucesso, sendo que este terá de ser sempre um ponto forte e inatacável. Uma oferta cultural que inclua preocupações com a diversidade de programas (temas, públicos, escalões etários, etc.), que crie condições para ser desejável e desejada e que seja pensada, nomeadamente, nas suas grandes linhas, a um prazo de cinco anos.

Articulada com esta linha de reflexão, há que desenvolver uma fortíssima “acção de marketing” de carácter institucional, a diversos níveis: na relação com os poderes públicos, envolvendo a classe política de diferentes quadrantes; no relacionamento efectivo com todas as Instituições, estreitando relações com outros intervenientes públicos (desportistas, empresários, associações de diverso cariz, etc.); na relação estreita e continuada com a esfera do social, prestando apoio aos que precisam, participando na defesa de grandes causas, desenvolvendo mecanismos de reconhecimento do mérito, quer internos (actor / músico / dançarino revelação, galas anuais sectoriais ou globais), quer externos (agradecimento público aos mecenas, promovendo convívio com outras figuras institucionais como mecanismo do reconhecimento mútuo, bem como aos voluntários, com antestreia especial para os voluntários). E, naturalmente que todo este trabalho terá que ser suportado por boas “campanhas de comunicação”, havendo que ter em linha de conta a importância de criar linhas de comunicação com diferentes públicos, implementando diferentes formas de comunicar.

Da articulação destes dois vectores do Marketing, deverá ser suscitado junto do público o sentimento de querer pertencer, de se querer juntar a um projecto de sucesso, de querer partilhar a experiência de integrar a proposta, com reflexos na criação de linha de voluntários de apoio à actividade e/ou clube de amigos do… teatro, coro, orquestra, grupo de dança, folclore, banda, artes plásticas, etc.

Importa depois estabelecer uma boa articulação entre todos estes aspectos e outro ainda a considerar. A este tema, voltarei na próxima semana.

Nuno Domingos


(re) pensar o C.C.S.

No Círculo Cultural Scalabitano as suas Secções e os seus Departamentos, têm influenciado quase toda a sua dinâmica associativa e, decisivamente, a sua evolução, tendo por base um projecto transversal, em termos da promoção de espectáculos, de formação e produção artísticas, sustentada por um conjunto de pessoas que, pela sua dedicação e empenho, têm garantido, ao longos dos anos, uma operacionalidade positiva, em termos da gestão do projecto e de uma contínua e permanente actividade.

Foi esta a prática que permitiu implantar o Círculo Cultural Scalabitano, projectando-o na vida cultural de toda uma região e até do País.
No entanto, e sem perder de vista a linha de actuação que tem vindo a ser seguida, o C.C.S. encontra-se num momento em que necessita de ser (re) pensado e, eventualmente, redefinida a sua Missão cultural.

Para “pensar” esta Missão, iremos constituir grupos de trabalho que irão reflectir acerca de quem somos e onde nos encontramos hoje, qual é a nossa finalidade, o que iremos fazer para responder a essa finalidade, quais são as nossas cultura e filosofia, o que nos faz ser distintos e únicos, quais os nossos pontos fortes e fracos, e quais sãos os nossos objectivos e propósitos futuros, de forma a que possamos traçar as metas a atingir.

Para além daqueles grupos de trabalho, pretendemos, através do nossa blog na internet, “ouvir” a opinião de todos os nossos associados e população em geral, pelo que lançamos, desde já, o debate em torno desta questão, o que fazemos tendo por base uma perspectiva de responsabilidade partilhada, onde o envolvimento dos cidadãos não é só uma mera figura de retórica.
Assim, contamos com a sua participação.

Eliseu Raimundo
(Presidente da Direcção do C.C.S.)